A violência israelita contra palestinianos nunca acabará, graças à hipocrisia da ONU e dos EUA, por Eva Bartlett
* foto da internet de uma enorme quantidade de gás sufocante sobre o protesto em Gaza. Mais ignóbil ainda, fotos de desarmados manifestantes palestinianos mutilados e massacrados.
Os EUA aceitam na boa "rebeldes" como os da Al-Qaeda "protestando" na Síria mas, quando genuínos palestinianos desarmados, protestam contra os ocupantes que violentamente os expulsaram de suas casas e de suas terras, os EUA acusam-nos de "incitação à violência".
No mesmo dia, uma mulher palestiniana, armada apenas com uma bandeira, caminhava em direcção à cerca que a aprisionou por tantos anos. Foi também alvo de um dos franco-atiradores.
Por entre os 17 mortos daquele dia, encontrava-se uma rapariga de 16 anos e um agricultor de 27 anos, este último morto por um tanque israelita.
Até a BBC, que não é propriamente conhecida por noticiar com justiça o que se passa na Palestina, notou que: "O primeiro a morrer foi Omar Samour, de 27 anos, um agricultor palestiniano morto pelos bombardeamentos israelitas enquanto trabalhava na sua terra, na sexta-feira de manhã, perto de Khan Younis, antes dos protestos começarem."
No entanto, de acordo com Israel, esse agricultor era um "terrorista infiltrado", terminologia que Israel usa para branquear os seus assassinatos extrajudiciais.
A Sputnik relata que o porta-voz do exército israelita tuitou, orgulhosamente, que eles sabem "onde foi parar cada bala", mas depois apagou o tuíte, provavelmente por ser bem claro que essas balas atingiram corpos de manifestantes desarmados.
Nos três anos que vivi em Gaza, acompanhei com frequência manifestações do género, e também o fiz em inúmeras manifestações, quando permaneci, enquanto activista, oito meses na Cisjordânia. Tendo vivenciado na pele estes tipo de situações, estou bem ciente da imoralidade da conduta israelita.
Nas dezenas de manifestações na Cisjordânia e na Faixa de Gaza que acompanhei, a “violência” teve sempre início com munições reais disparadas por israelitas, balas de chumbo cobertas com uma fina camada de borracha e gás lacrimogéneo sufocante contra palestinianos desarmados. O fato dos jovens palestinianos terem optado por responder com lança-pedras é um direito que lhes assiste. Pela minha experiência, foi sempre Israel que começou, atirando para mutilar e para matar, sequestrando e aprisionando manifestantes desarmados.
No Dia do Território, em Março de 2010, participei numa das seis manifestações que ocorreram na Faixa de Gaza, na aldeia de Khoza, a leste de Khan Younis. Os quatro jovens palestinianos alvejados por atiradores israelitas naquele dia relataram terem sido baleados com munições reais sem nenhum aviso prévio, incluindo um tiro na cabeça de um deles
E, tal como nas manifestações do Dia do Território de Março de 2018, Israel considerou aceitável o ataque de 2010: “uma investigação demonstrou que "os soldados agiram de acordo com os procedimentos de dispersão aceites" no que diz respeito à violência das forças armadas israelitas contra os manifestantes desarmados.
Os “procedimentos de dispersão aceites”, de Israel, ocorrem diariamente na Palestina ocupada, seja contra manifestantes desarmados na aldeia de Bilin, perto de Ramallah, seja contra agricultores desarmados (desde crianças até idosos) em Gaza.
Estes procedimentos incluem disparar contra civis palestinianos a partir de torres armadas controladas à distância, instaladas ao longo da vedação que delimita Gaza. Israel também utiliza como alvos outros civis que trabalham nas zonas fronteiriças, incluindo crianças e jovens que fazem recolha de entulho e sucata usados na construção civil.
*Fotos de um artigo de 24 de Abril de 24, 2010 , após um protesto não violento no qual 3 pessoas foram feridas com balas reais disparadas por israelitas.
Os media ocidentais estão relatando que estes ataques de 2018 contra manifestantes palestinianos representam o mais sangrento dia em Gaza desde os “confrontos” de 2014. A terminologia “confrontos”, usada em referência ao brutal bombardeamento israelita contra Gaza em 2014, e também aos recentes assassinatos de protestantes civis às mãos de israelitas, é uma típica distorção da realidade por parte dos meios corporativos, assim como uma distorção da correlação de poder. Quando manifestantes desarmados lutando por direitos humanos são literalmente abatidos, não podemos falar de "confrontos" mas sim de assassinatos.
Além disso, esta linguagem nega os quase diários ataques de israelitas contra fazendeiros, pescadores e pessoas que trabalham nas regiões fronteiriças. Isto inclui bombardear e atirar contra mulheres, idosos e crianças.
*Do meu artigo de Fevereiro de 2009, “Israeli Soldiers Shoot Deaf Palestinian Farmer, 4th Farmer Shot in 3 weeks”
Durante o trabalho de acompanhamento de agricultores que fiz em Gaza, muitos soldados israelitas dispararam balas reais em torno de agricultores e de outros voluntários como eu, a uma muito curta distância, num esforço para agredir e afugentar os agricultores para fora das suas terras. A política de Israel de atacar agricultores e pescadores palestinianos faz parte da sua política mais ampla de tornar os palestinianos totalmente dependentes de ajuda alimentar inadequada e, de forma desnecessária, completamente empobrecidos.
Em 2011, escrevi sobre a destruição israelita da agricultura palestiniana em Gaza:
Cerca de uma década atrás, os agricultores palestinianos ainda podiam aceder a terras até cerca de 50 metros da fronteira. A "zona proibida" israelita foi sendo expandida ao longo dos anos, para 150 metros, depois para 300 metros, privando os agricultores palestinianos dos seus pomares, plantações e pastagens.
Uma década depois, com esses pomares destruídos por bulldozers israelitas, os agricultores lutam agora pelo acesso a terras até dois quilómetros para além da zona tampão de 300 metros, tornada uma zona proibida pelos militares israelitas.
Mais de 30% das terras agrícolas de Gaza não são usadas devido às zonas tampão. Esta é a terra mais fértil de Gaza, onde árvores de oliveiras, de frutos, de citrinos e de nozes floresciam outrora, juntamente com trigo, cevada, centeio e outras culturas, fornecendo grande parte das necessidades de Gaza. ”
Mais tarde, dois brutais bombardeamentos israelitas sobre Gaza, diminuiram ainda mais a percentagem de terras agrícolas viáveis.
Turquia e Israel competem pela supremacia moral
Em reacção aos ataques de Israel contra protestantes palestinianos, o Presidente Recep Tayyip Erdogan criticou Israel dizendo:
Não preciso dizer ao mundo o quão cruel são as forças armadas israelitas. Podem bem constatar o que este estado terrorista tem feito olhando para o que se passa em Gaza e em Jerusalém. Israel cometeu um massacre e Netanyahu é um terrorista."
Apesar de concordar com esta afirmação, é particularmente irónico que ela venha do líder de um estado que está em guerra com a Síria e que tem dado passagem segura e armas a terroristas que têm lá entrado e morto, nos últimos meses, centenas de civis no noroeste da Síria.
Desde Janeiro último, a Turquia tem bombardeado Afrin, no noroeste da Síria. A última contagem de casualidades que encontrei falava de 222 civis mortos e 700 feridos (à data de 10 de Março de 2018). Um relatório mais recente fala de "mais de 1000 civis mortos assassinados" e milhares de desalojados por culpa dos bombardeamentos turcos.
E depois, claro, há o apoio directo de Israel aos terroristas na Síria, que inclui tratamento médico a terroristas das FSA e da al-Qaeda em hospitais israelitas.
Deste modo, tanto Israel como a Turquia têm as mãos manchadas de sangue de civis, embora nenhum dos dois tenha sido responsabilizado por isso.
Jamais foi feita justiça em nomes dos civis mutilados, assassinados e aprisionados por Israel. Nem tampouco houve sequer um órgão internacional que tenha feito pressão em prol da justiça. Palavras fracas, rapidamente esquecidas... não será por aí que se alcançará a justiça e a responsabilização dos perpetradores desses crimes.
Reacção da ONU previsivelmente fraca
Em reacção aos assassinatos de manifestantes palestinianos por parte de Israel, as Nações Unidas emitiram fracas declarações de preocupação, mas não foi feita nenhuma condenação a sério contra abrutalidade de Israel.
Ausente o repúdio, que os órgãos e representantes da ONU normalmente reservam para propaganda de guerra e para branqueamento de terrorismo na Síria, o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, ofereceu os seus “pensamentos” às famílias das vítimas assassiandas por Israel. Pediu também "uma investigação independente e transparente sobre esses incidentes". E quem faria tal investigação? Israel? A ONU?
Avigdor Lieberman, ministro da defesa israelita, conhecido pelas suas declarações anti-palestinianas, interditou que se faça algo do género, afirmando: “Não haverá comissão de inquérito. Nós não cooperaremos com nenhuma comissão de inquérito ”.
O secretário-geral adjunto da ONU, Tayé-Brook Zerihoun, descreveu o dia do massacre como tendo “descambado em violência em vários locais da Faixa de Gaza”. Dezassete palestinianos (desarmados) assassinados por franco-atiradores de elite israelitas não é "descambamento em violência", é massacre. Um premeditado massacre.
Já podemos ir contando com zero acções ou justiça vindas da ONU, quando a vemos menorizar um tal massacre, e sabendo que Israel, em anteriores massacres de palestinianos, não foi nunca considerada culpada nem pela ONU nem pelo Estado que a ONU rotineiramente pede que investigue os seus próprios crimes.
Nessa mesma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o delegado dos EUA na ONU, Walter Miller, teve a ousadia de culpar os palestinianos. Miller descreveu os civis palestinianos como: “Fracos actores que usam protestos como desculpa para o incitamento à violência, pondo em risco vidas inocentes”.
Os EUA não vê problema nenhum em "rebeldes" como os da al-Qaeda "protestando" na Síria, mas quando manifestantes genuinamente desarmados na Palestina exercem o seu direito, de acordo com a lei internacional, de protestar contra os ocupantes que violentamente os expulsaram de suas casas e de suas terras, já acha se trata de "incitamento à violência". A hipocrisia dos EUA e da ONU é infinita e, em consequência, a violência de Israel nunca terá um fim.
Enquanto a Turquia chora lágrimas de crocodilo pelos palestinianos, Israel finge ser o exército mais moral do mundo, e a ONU fecha os olhos aos crimes de Israel e à limpeza étnica de palestinianos. E os palestinianos, de forma corajosa, continuam protestando contra os crimes de Israel.
Como Gareth Porter tuitou: “muitos milhares de habitantes de Gaza preferem morrer como mártires do que se submeter à política israelita de morte lenta; Os franco-atiradores israelitas continuarão matando manifestantes palestinianos a sangue frio; O governo dos EUA e os media deram luz verde a Israel ”.
A ONU, os media corporativos e os líderes do planeta podem ignorá-los ou difamá-los, mas os palestinianos continuam enfrentando as forças armadas e o governo mais imorais da região.
Artigos Relacionados (em inglês)
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-Israeli Navy Terrorism: Destroying Boats and Lives, Sep 2009, In Gaza
-the hardest jobs: children working in areas targeted by Israel, March 3, 2010, In Gaza
-My entries from occupied Palestine, April-December 2017, OPT2007
-Protesters take Rubber Bullets to Head and Stomach at Bil’in, June 16, 2007, OPT2007
-Reflections on accountability, Bil’in, Aug 13, 2007, OPT2007
-Israel never stopped pirating in Palestinian waters, Apr 24, 2013, RT.com (further related links on In Gaza post)
-Observations from Occupied Palestine: Gaza, Jan 1, 2014, In Gaza
Eva Bartlett, 04.04.2018
traduzido para o português por Luís Garcia
versão original em inglês: ISRAELI VIOLENCE AGAINST PALESTINIANS WILL NEVER END AS A RESULT OF UN & US HYPOCRISY