A "ligação curda": Os esforços de Israel, ISIS e EUA para destabilizar o Irão, por Sarah Abed
Parte 2/3
Na primeira das 3 partes da análise que Sarah Abed, analista independente, escreveu para o Mint Press News, foi exposta a moderna aliança curdo-israelita que estes têm tentado manter secreta de modo a evitar a atenção do público sobre o seu derradeiro plano, assim como o uso de facções curdas por parte dos EUA para desestabilizar o Médio Oriente. Os curdos se comprometeram com tais relações em parte por causa das divisões internas e da desunião, o que também dificultou o cumprimento do seu objectivo de estabelecer um Curdistão completamente autónomo sobre os quatro países que actualmente ocupam.
Examinámos também as tentativas do governo sírio para manter o país unido, abordando e implementando mudanças constitucionais que beneficiam os curdos - tentativas que ainda não conseguiram convencer os separatistas curdos a abandonar o seu objectivo de balcanizar e confiscar ilegalmente partes da Síria à custa daqueles que lá residem.
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Na parte 2 este tema é examinado em maior profundidade, na esperança de aumentar a consciencialização sobre esta pouco conhecida mas importante parte do quebra-cabeça sírio. Abed analisará a ligação curda ao apartheid israelita e a razão pela qual este último tem vindo a ter um tão grande interesse pelos curdos, assim como o estranho fenómeno dos veteranos militares ocidentais que viajam até à Síria para lutar ao lado dos curdos.
A ligação curda ao ISIS será também abordada, uma vez que vários curdos optaram por lutar ao lado do segundo. As alianças curdas com grupos terroristas armados na Síria - em particular com o ISIS - são sinais muito reveladores sobre até que extremos poderão ir os curdos para que a sua manifestação ideológica de um Curdistão independente e autónomo veja a luz do dia.
Os planos geopolíticos de Washington e Tel Aviv para dominar o Médio-Oriente só podem ser desmantelados se a maioria dos cidadãos entender os intrincados jogos de poder nos bastidores deste seu plano. Em última análise, o objectivo não é apenas desestabilizar o Iraque e a Síria e dividi-los em pequenos estados, mas também enfraquecer a presença global do Irão - objectivos que têm vindo a perseguir com a ajuda dos curdos.
As ligações curdas com Israel
A relação curdo-israelita tem amadurecido significativamente. Desde pelo menos a década de 1960, Israel providenciou intermitentemente aos curdos assistência em segurança e em treino militar. Tal serviu principalmente como uma ferramenta anti-Saddam - mantendo-o distraído enquanto Israel lutava duas guerras contra coligações de vizinhos árabes -, mas a compreensão mútua dos seus problemas criou também uma afinidade curdo-israelita. Todos os sinais apontam para que esta cooperação em matéria de segurança continue. A aquisição israelita de petróleo curdo a preços acessíveis não só indica um fortalecimento dos laços económicos entre os dois, como também uma permanente ligação israelita à empobrecida Erbil que sugere uma aposta estratégica nos curdos, presentes nesta região em desenvolvimento.
O povo mais próximo dos judeus numa perspectiva genética poderá ser o curdo, de acordo com os resultados de um recente estudo da Universidade Hebraica.
Os curdos são aliados do mais feroz inimigo sírio - Israel - cujo planeado projecto da Grande Israel por coincidência encaixa quase perfeitamente no plano curdo de criar um "Curdistão". No plano Oded Yinon, que é o plano da "Grande Israel", é referido o imperativo uso de curdos para ajudar a dividir os países vizinhos como reforço aos seus planos para uma maior domínio. De forma muito interessante, os curdos desvalorizam esta aliança como sendo apenas mais um passo rumo ao seu objectivo final de criar um Curdistão autónomo.
Os principais grupos políticos curdos na região têm laços de longa data com Israel, relacionados com uma importante violência étnica contra árabes, turcomenos e assírios. Todos, desde o PKK na Turquia ao PYD e YPG na Síria, desde o PJAK no Irão, o mais notório de todos eles, até ao regime mafioso Barzani-Talabani (KRG/Peshmerga) no norte do Iraque. Portanto, não deve ser surpresa para ninguém que Erbil tenha fornecido ao ISIS armamento para enfraquecer o governo iraquiano de Bagdad. E quando se compreende que Erbil é apenas a frente de batalha de Tel Aviv no Iraque, a orquestração fica bem mais clara.
De acordo com informações disponibilizadas, Israel tem vindo a fornecer o KRG com armamento e treinos mesmo antes deste ter começado a confrontar-se com o ISIS. Ao nível da estratégia económica, Israel forneceu um apoio essencial ao KRG comprando petróleo curdo em 2015, altura em que nenhum outro país ousou fazê-lo devido às ameaças de perseguição judicial vindas de Bagdad. O ministro dos Recursos Naturais do KRG, Ashti Hawrami, admitiu inclusive o acordo, dizendo que o petróleo curdo era frequentemente canalizado através de Israel para evitar detecção.
Em Janeiro de 2012, o jornal francês Le Figaro afirmava que agentes de inteligência israelitas estavam recrutando e treinando dissidentes iranianos em bases clandestinas localizadas na região curda iraquiana. Ao alinhar com os curdos, Israel ganhava olhos e ouvidos no Irão, no Iraque e na Síria. Um ano depois, o Washington Post revelava que a Turquia havia revelado aos serviços secretos iranianos uma rede de espiões israelitas que operava no Irão, incluindo dez pessoas que se acreditava serem curdas e que, segundo este jornal, ter-se-iam encontrado com membros da Mossad na Turquia. Esta relação precária entre Israel e Turquia persiste até os dias de hoje.
Veteranos ocidentais juntam-se à causa curda
O Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, e a sua filial síria, o YPG, são movimentos radicais de culto que entrelaçam o marxismo, o feminismo, o Leninismo e o nacionalismo curdo num cocktail ideológico que atrai novos membros através do uso extensivo de propaganda apelando a cada um desses modos de pensamento. Abdullah Oçalan, líder do PKK, inspirou-se no anarquista norte-americano Murray Bookchin para criar a sua própria filosofia à qual chama de "Confederalismo Democrata".
O YPG, filial da PKK, representa a maior parte dos membros da SDF na Síria. Com o apoio político ocidental, o YPG ganhou popularidade e obteve um impressionante apoio de muitos veteranos militares ocidentais, alguns dos quais deixaram o conforto dos seus países para virem lutar por esta organização. Uma das ferramentas de marketing mais produtivas foi a de usar jovens e atraentes combatentes como rostos das guerrilhas. Durante a sua luta contra o ISIS, o PKK saturou meios de comunicação com imagens destas jovens "combatentes da liberdade", usando-as como uma ferramenta de marketing que levou a sua causa do desconhecimento à fama.
Mas o que não é relatado é que este movimento realiza sequestros e assassinatos, e está envolvido no tráfico de drogas.
Famílias curdas estão exigindo que o PKK pare de sequestrar menores de idade. O incidente teve início no dia 23 de Abril, dia em que a Turquia celebrou o 91º dia da Soberania Nacional e o Dias das Crianças. Enquanto crianças na Turquia ocidental celebravam o feriado, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) sequestrava 25 estudantes entre os 14 e 16 anos no leste do país, em Diyarbakir.
Embora o PKK tenha sequestrado mais de 330 menores nos últimos seis meses, a família Bockum foi a primeira na região que colocou uma tenda perto de sua casa e iniciou um protesto, desafiando o PKK e exigindo que esta organização devolvesse o seu filho. Sinan foi devolvido à família a 4 de maio. Al-Monitor relatou este incidente desde o início em grande detalhe.
Como informou Bebyin Somuk num artigo seu, o PKK e o PYD continua sequestrando crianças na Turquia e na Síria. Segundo Bebyin, "como escrevi anteriormente para Kebab e Camel, o PKK comete crimes de guerra ao recrutar crianças como soldados. Alguns dos militantes do PKK que se renderam ontem eram também soldados-criança do PKK. As fotos mostram claramente que essas crianças não têm mais de dezasseis anos de idade. O exército turco publicou o vídeo dos 25 militantes do PKK que se renderam em Nusaybin ".
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A South Front publicou informações sobre as tropas femininas do PKK que mataram soldados turcos. "O comando das tropas femininas do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) divulgou uma declaração, alegando que as mulheres do PKK mataram 160 militares turcos em 2016. Segundo o comunicado, o comando das tropas femininas do PKK realizaram 115 operações contra as forças do governo turco em 2016. O grupo também prometeu "prosseguir a luta durante o Ano Novo por uma vida de liberdade até que a vitória seja alcançada".
O PKK está também matando curdos sob o pretexto de proteger os seus direitos. "Um comandante do PKK, Cemil Bayık, numa entrevista à Agência de Notícias Fırat (ANF) em 8 de Agosto afirmou que: "A nossa guerra não será confinada às montanhas como antes. Ela espalhar-se-á por todo o lado sem distinção entre montanhas, planícies ou cidades. A nossa guerra chegará às metrópoles". A declaração do terrorista Bayık indicava que o PKK passaria a atacar cada vez mais alvos civis e a visar mais do que nunca zonas civis. E é o que está acontecendo. Desde o dia 15 de Julho, dia em que o culto terrorista gülenista FETÖ lançou a sua tentativa falhada de golpe militar para derrubar o governo democraticamente eleito, o PKK realizou dezenas de ataques terroristas matando 21 civis e ferindo outros 319, na sua maioria curdos.
De acordo com o The Washington Institute "No dia 18 de Novembro o director do FBI, Robert Mueller, reuniu-se com altos funcionários turcos para discutir o tema dos esforços turco-americanos contra o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), também conhecido como Kongra-Gel. Um comunicado de imprensa da embaixada dos Estados Unidos em Ancara, na sequência da reunião, enfatizava que os funcionários dos EUA "apoiam firmemente os esforços da Turquia contra a organização terrorista do PKK" e destacava a longa história de trabalho conjunto dos 2 países na luta contra o terrorismo e o crime organizado transnacional.
Estas são questões oportunas. Apesar da recente tentativa de Ancara para suavizar a questão curda - uma proposta denominada "abertura democrática" - o PKK é uma de um número crescente de organizações terroristas com participações significativas no comércio internacional de drogas. Em Outubro, o Departamento do Tesouro dos EUA adicionou três líderes seniores do PKK / Kongra-Gel à sua lista de traficantes estrangeiros de narcóticos. O PKK, juntamente com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), é uma das poucas organizações mundialmente designadas pelo governo dos EUA como uma organização terrorista e um importante traficante estrangeiro de narcóticos ".
O tráfico de drogas é relatado como a principal fonte financeira do terrorismo do PKK, de acordo com a organização International Strategic Research, cujo relatório detalhado pode ser visto aqui.
Seus triunfos (mediaticamente exagerados) contra o ISIS ajudaram o PKK a evoluir de uma milícia radical para uma suposta força com poder regional. Foram bem sucedidos na luta contra o ISIS na Síria? Sim - mas, embora o Exército Árabe Sírio tenha sido mais eficaz, não recebeu uma fracção do louvor ou reconhecimento que o PKK recebe.
Pato Rincon, um veterano militar dos EUA, escreveu recentemente sobre sua experiência com o YPG na Síria. Embora inicialmente interessado nos desejos de autonomia destes, rapidamente acabou por descobrir uma outra faceta do grupo:
"Apesar de descendentes ideológicos directos da União Soviética, a sua visão do marxismo tem uma inclinação muito mais nacionalista do que a dos seus antepassados internacionalistas. No campo de treino onde exerci funções, eles falavam constantemente do seu direito a uma pátria livre e autónoma - coisa que eu poderia apoiar. Por outro lado, eles alegavam que todas as culturas vizinhas, da árabe à turca, até à persa, são descendentes da cultura curda. Versão difícil de acreditar, não?, se se tiver em conta que os curdos nunca tiveram nenhuma autonomia como aquela pela qual agora lutam. Todo aquele nacionalismo engasgado que se disfarçava de internacionalismo era fácil de detectar ... não só a sua ideia de marxismo era imbecil, sua versão do feminismo era ainda pior ".
Relatos do género certamente não chegarão aos meios de comunicação mainstream, visto não se encaixarem na narrativa que os curdos e seus patrocinadores promovem.
Noutro exemplo de apoio ocidental ao YPG, Joe Robinson, um antigo militar britânico, regressou recentemente ao seu país depois de ter passado meses na Síria combatendo pelo referido grupo. Assim que regressou ao país foi de imediato preso por agentes da Polícia da Grande Manchester por suspeita de actividades terroristas. Joe Robinson entrou no exército britânico quando tinha 18 anos e em 2012 esteve no Afeganistão servindo o Regimento do Duque de Lancaster.
Entretanto, Joe Robinson saiu do Reino Unido quando foi emitido um mandato de captura por não ter comparecido em tribunal. Robinson aparece na fotografia abaixo na companhia de combatentes do YPG na Síria
Robinson aparece à esquerda, segurando a sua metralhadora, enquanto os seus colegas do YPG seguram uma bandeira do ISIS. As inscrições na parede atrás dizem muito sobre a relação entre Israel, EUA e os curdos.
FDS trabalhando com o ISIS
A mais evidente contradição que salta à vista é a colaboração dos curdos das FDS com os EUA na assim chamada "Operation Inherent Resolve", que é o nome oficial das operações anti-ISIS norte-americanas. Em simultâneo, a coligação liderada pelos EUA e que inclui unidades armadas curdas, permite que "militantes do grupo terrorista ISIS saiam de Raqqa em vez de os liquidar", como afirma Sergey Surovikin, comandante do grupo de forças russas na Síria.
"Em vez de eliminar terroristas culpados da morte de centenas e milhares de civis sírios, a coligação liderada pelos EUA e as FDS coludem com os líderes do ISIS, os quais, sem oferecer resistência armada, abandonam os territórios por si ocupados e avançam contra territórios onde as forças armadas sírias têm presença activa", acrescenta Sergey Surovikin.
A Sputnik Arabic obteve uma entrevista com Husma Shaib, um perito sírio em grupos armados presentes na Síria que explicou por que razão as FDS são comparáveis com a Frente al-Nusra e que indicou quais são afinal os verdadeiros objectivos das operações das FDS na Síria.
"Na Síria, nós vemos estas forças como ilegítimas organizações militares que operam fora do quadro legal. São iguais a unidades terroristas como a Frente al-Nusra e o ISIS. As Forças Democráticas Sírias não coordenam as suas actividades com as Forças Armadas da Síria. Nós encaramo-los enquanto terroristas", disse Shaib à Sputnik.
Os líderes do SDF anunciaram que tentarão anexar a maioria da cidade árabe de Raqqa caso consigam libertá-la
Os curdos estão realizando um massiva limpeza étnica de árabes em Raqqa, a fim de abrir caminho para a anexação da cidade à sua unilateralmente declarada "Federação", assim que a conquistarem.
Hostilidade contra as Forças Armadas da Síria
No dia 18 de Junho, um caça de guerra dos EUA abateu um caça-bombardeiro sírio Su-22 perto da cidade de Tabqa. A coligação liderada pelos EUA afirmou que o caça sírio atacou posições das FDS, adicionando que a coligação abateu o caça sírio na condição de membro do "colectivo de auto-defesa da coligação de forças parceiras", de acordo com a Sputnik News.
No entanto, as Forças Armadas da Síria (SAA) afirmaram que estavam, de facto, atacando posições do ISIS e não das FDS. As SAA enviaram depois uma missão de resgate para recuperar o piloto do caça abatido. A Al Masdar News (AMN) informou que as SAA debateram-se com uma intensa resistência por parte das FDS nesta missão de resgate, o que implicaria uma séria escalada de tensão entre os dois.
O Comandante Geral das Forças Armadas da Síria respondeu, num comunicado oficial, que a flagrante agressão demonstra sem a mínima margem de dúvida a real posição norte-americana de apoio ao terrorismo, no intuito de afectar as capacidades das SAA, a qual é a única força activa (a par dos seus aliados) que exerce de força legitima o seu direito de combater o terrorismo na Síria.
"O ataque enfatiza a coordenação entre os EUA e o ISIS, e revela as intenções malignas dos EUA em utilizar o terrorismo e investi-lo na aplicação do projecto norte-americano-sionista na região", acrescentou o comunicado.
Neste é ainda afirmado que tais agressões não afectariam as SAA na sua determinação em continuar a luta contra as organizações terroristas do ISIS e da Jabhat al-Nusra e para restaurar a segurança e a estabilidade em todos os territórios sírios.
No início da semana, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Ryabkov, disse à Sputnik que os ataques aéreos contra caças das SAA estão ajudando os terroristas. "No caso de ataques [por forças dos EUA contra aviões e drones das Forças Armadas da Síria], estamos lidando com uma cumplicidade aberta com os terroristas que operam em solo sírio", disse Ryabkov.
CIA arma curdos na CIA
A coligação liderada pelos Estados Unidos declarou em numerosas ocasiões que está trabalhando com as FDS para tentar derrotar o ISIS na Síria. No entanto, tem havido numerosos relatos de ataques aéreos liderados pelos Estados Unidos que visam civis, militares e infra-estruturas sírias. Esses erros mortais e evitáveis ilustram claramente como a presença da coligação liderada pelos EUA na Síria teve um impacto prejudicial sobre os civis. A 26 de Junho, as FDS cortaram o abastecimento de água a 1 milhão de civis em Aleppo. Algumas fontes declararam que tal aconteceu por via de ressentimentos para com os sírios, outros afirmaram que desconheciam o(s) motivo(s) por detrás desta destrutiva e deliberada acção contra civis inocentes.
A 5 de julho, a 21st Century Wire relatou os esforços dos EUA para estabelecer uma maior presença militar na Síria. "Os EUA estão estabelecendo suas bases militares nos territórios que foram libertados do ISIS pelos nossos combatentes durante a luta contra o terrorismo", afirmou um alto representante da FDS.
"O número de instalações militares dos EUA na Síria aumentou para oito bases de acordo com relatórios recentes e, possivelmente, para nove, de acordo com outro analista militar", informou o 21st Century Wire.
O governo sírio considera que os curdos separatistas são tão perigosos quanto o ISIS e outros grupos terroristas no país. Os seus planos para desestabilizar o país são mais perigosos do que os do ISIS, especialmente porque o Ocidente lhes oferece apoio moral, armas, treino, ajuda financeira, veículos armados e até apoio aéreo. "Nós iremos recuperar [armas] durante a batalha, e repará-las. Quando eles não precisarem de certas coisas, nós as substituiremos por algo que precisem", afirmou o secretário de Defesa dos Estados Unidos, James Mattis, no final de Junho.
Curdos vendendo armas oferecidas pela Alemanha para combater o ISIS
Repórteres das emissoras alemãs NDR e WDR encontraram vários espingardas de assalto G3 e uma pistola P1, todas com as iniciais "BW" nelas gravadas, e que significam Bundeswehr (as Forças Armadas da Alemanha) nas cidades do norte do Iraque de Erbil e Sulaymaniyah.
As armas aparentemente vieram de stocks que o governo alemão entregou ao governo autónomo curdo do norte do Iraque. As armas eram destinadas a ser usadas na luta contra o ISIS. Vários membros de partidos verdes e de esquerda da Alemanha têm vindo a afirmar no parlamento a sua preocupação de que as armas entregues aos Peshmerga possam cair nas mãos erradas.
Houve vários relatórios credíveis, desde que a aliança militar liderada pelos EUA se formou para ajudar a combater o ISIS na Síria e no Iraque, de armas fornecidas pelos Estados Unidos que caíram nas mãos de milícias não aliadas e até mesmo nas mãos do ISIS.
Os EUA armaram os curdos e apoiaram seus esforços desde que os ajudaram a estabelecer as Forças Democráticas da Síria a 10 de Outubro de 2015. Os EUA precisavam financiar um grupo dentro da Síria que estivesse lutando contra o ISIS mas que não fosse tão extremista quanto o ELS (Exército de Libertação Sírio, FSA na sigla inglesa), agora reconhecidamente afiliado à al-Qaeda. Os EUA declararam que a principal razão para estar na Síria seria a luta contra o ISIS, mas as suas acções provaram o contrário. A sua verdadeira missão é desestabilizar o país, ajudando os curdos (através do FDS) e outras forças de oposição armadas na libertação de terras que possam ser usadas como ferramentas de regateio em futuras negociações.
Ron Paul explica porque é uma perigosa ideia o armamento de curdos:
Washington descartou repetidamente a evidência irrefutável de Ancara de que o YPG é uma extensão da ilegal organização terrorista do PKK que aterrorizou a Turquia por mais de três décadas. O secretário de defesa dos EUA, James Mattis, enviou uma carta ao seu homólogo turco, Fikri Işık, declarando que os Estados Unidos recuperariam as armas enviadas para o YPG imediatamente após a derrota de ISIS.
Enquanto isso, o Departamento de Defesa dos EUA fornecerá a Turquia listas detalhadas dos materiais e equipamentos militares enviados para o YPG, o que implica que os EUA pretendem garantir transparência à sua relação bilateral. Esta é uma tentativa de retrocesso numa terrível decisão na qual os Estados Unidos podem ou não acreditar naquilo que eles próprios fizeram. Se esta realidade ainda não se esgotou, certamente esgotar-se-á quando os curdos se recusarem a devolver as armas ou decidir vendê-las. Washington terá que lidar com uma Turquia ainda mais desapontada.
Por que razão curdos se juntam ao ISIS
Durante mais de um ano, as forças curdas uniram-se contra os sangrentos ataques do ISIS a curdos. Assim sendo, como é que o ISIS ainda consegue recrutar centenas de jovens curdos para lutar pelo califado contra as suas próprias famílias?
"Há famílias curdas em Halabja cujos filhos se alistaram ao ISIS e os seus corações estão quebrados, mas nunca irei aos seus funerais", disse a mãe triste de Kaihan Borhan, um curdo que morreu lutando com os Peshmerga contra o ISIS. A sua família está preocupada com o facto de que as pessoas responsáveis pela sua morte poderiam ser de etnia curda.
"Eu tenho um amigo cujo irmão morreu lutando pelo ISIS", disse o irmão de Kaihan. "Eu nunca fiz luto por ele e o meu amigo não suporta olhar-me nos olhos". Aqui, podemos ver o caminho para o extremismo que muitos curdos tomaram. A insatisfação com o serviço de inteligência curdo, a perseguição de Asayish aos muçulmanos e as queixas domésticas estão sendo habilmente exploradas pelo ISIS através do uso da propaganda liderada por Khattab Al-Kurdi e a sua Brigada Saladin.
"Com a permissão de Deus, semearemos as sementes do califado em toda a nossa terra", disse Khattab, que foi uma das forças mais persuasivas no recrutamento de curdos para o califado. Mesmo com a relatada morte de Khattab em Abril de 2015, a ameaça de que mais curdos se juntem ao ISIS provavelmente não diminuirá, ainda mais com um novo imã curdo levando para a frente a retórica do grupo.
Curdos usados para desestabilizar o Irão
Documentos vazados pela WikiLeaks em 2010 sugeriam que o chefe da israelita Mossad, Meir Dagan, queria usar curdos e minorias étnicas para derrubar o governo iraniano. O serviço de espionagem israelita tinha como objectivo criar um Irão fraco e dividido, numa situação semelhante à do Iraque, onde os curdos têm o seu próprio governo autónomo, disse o chefe da organização de espionagem a um funcionário dos EUA.
O Partiya Jiyana Azad a Kurdistane (PJAK), um grupo militante de nacionalismo curdo com sede no norte do Iraque, vem realizando ataques contra forças iranianas na província do Curdistão do Irão (Curdistão Oriental) e outras áreas habitadas por curdos. Metade dos membros do PJAK são mulheres. O PJAK tem cerca de 3.000 milicianos armados. Eles representam mais um exemplo de curdos que se encontram no meio de um conflito e são usados como peões pelo Ocidente.
O partido está intimamente ligado ao PKK. O Irão sempre acusou o PJAK e outros grupos nacionalistas curdos do Irão de serem apoiados por Israel. O jornalista Seymour Hersh afirmou também que os EUA apoiaram o PJAK e outros grupos de oposição iranianos. No entanto, tanto os EUA como Israel negaram apoiar o PJAK. Na verdade, o Tesouro dos EUA (U.S. Treasury) classificou no ano passado o PJAK como sendo uma organização terrorista.
Como Hersh notou em 2004: "Os israelitas têm laços de longa data com os clãs Talibani e Barzani [no] Curdistão e há muitos judeus curdos que emigraram para Israel e ainda há muita conexão. Mas a um dado momento antes do final do ano [2004], e eu não estou exactamente seguro de quando, eu diria que há uns bons seis, oito meses atrás, Israel começou a trabalhar com alguns comandos curdos bem treinados. Ostensivamente, a ideia era que israelitas (algumas das unidades de comandantes de elite israelitas, unidades anti-terroristas ou terroristas, dependendo do seu ponto de vista) treinassem as forças curdas no intuito de as modernizar".
Por que razão os chamados "lutadores pela liberdade" curdos estão dispostos a ir para a cama com um qualquer grupo que tenha interesse em desestabilizar a Síria? A maneira provocadora com que as FDS se associaram com organizações terroristas durante a guerra na Síria entra em flagrante contradição com a imagem de "revolucionários" produzida pelas suas relações públicas e que pela qual lutaram tanto nos últimos anos.
Iraque, Síria, Turquia e Irão continuam a opor-se à noção de ter suas fronteiras e soberania divididas pelos EUA em mais uma experiência NATO-norte-americana de engenharia social no Médio Oriente.
Tentativas de reescrita da história geográfica
Cerca de 30 milhões de curdos residem principalmente em regiões montanhosas do actual Irão, Iraque, Síria e Turquia. Estes continuam sendo a maior população nómada do mundo sem um estado soberano. No entanto, os curdos não são monolíticos e as suas identidades tribais e os interesses políticos muitas vezes sobrepõem-se a uma fidelidade nacional unificadora.
Alguns curdos, particularmente aqueles que migraram para centros urbanos, como Istambul, Damasco ou Teerão, integraram-se e deixaram se assimilar, enquanto muitos dos que permanecem em suas terras ancestrais mantêm um forte sentido de identidade claramente curda. Uma diáspora curda de cerca de dois milhões de pessoas está concentrada principalmente na Europa, com mais de um milhão só na Alemanha. Estes vagabundos migratórios nunca possuíram o seu próprio país em nenhum momento da sua história, pelo contrário, sempre fizeram parte de um país ou um império maior que os acolheu e lhes forneceu refúgio.
A versão dos eventos que os curdos apresentam está em constante contraste com a versão que é apoiada pela maioria dos historiadores. Este provou-se ser um ponto de disputa entre os curdos e os cidadãos de outros países.
Por exemplo, os curdos afirmam ter sido conquistados e ocupados ao longo de sua história. Aqui está um exemplo da sua tentativa de reescrever a história para a adequar à sua narrativa: "A região curda assistiu a uma longa lista de chegada de invasores e conquistadores: os antigos persas do leste, Alexandre o Grande vindos de oeste, os árabes muçulmanos no século 7 a partir do sul, turcos Seljuk no século 11 a partir do leste, os mongóis no século 13 vindos de leste, persas medievais de leste e turcos otomanos do norte no século 16 e, mais recentemente, os EUA com a sua invasão do Iraque em 2003".
Na terceira parte desta série de artigos de Sarah Abed para o MPN, onde é analisado o papel curdo de apoio ao plano de desestabilização do Médio Oriente dos EUA e de Israel, a autora cobre o tema das violações de direitos humanos, presentes e passadas, perpetradas por curdos contra árabes e contra minorias cristãs, assim como expõe os equívocos quanto aos motivos pelos quais os curdos permanecem sem um estado próprio.
traduzido para o português por Luís Garcia
versão original em inglês: The Kurdish Connection: Israel, ISIS And U.S. Efforts To Destabilize Iran