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Pensamentos Nómadas

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O meu empirismo é melhor do que o teu

28.06.16 | Luís Garcia
 

 

RICARDO MINI copy SOCIEDADE  

 

"O meu empirismo é melhor do que o teu / ou porque é que a ciência nunca há de ser popular"

 

Para começar, não venho aqui ser moralista. E, precisamente por isso, é que vou falar da tia Mariazinha. E, perguntam vocês, quem é a tia Mariazinha? Ora, a tia Mariazinha é uma personagem fictícia que eu acabei de batizar, para servir de personificação da grande matriarca latina que, para toda a gente que tem avós vivas, é a grande fonte de sabedoria inesgotável e de julgamento moral infalível. Uma espécie de papa, só que normalmente com muletas e diabetes tipo II, porque esta espécie de papas não tem acesso fácil a clínicas de renome nem pode mobilizar grandes especialistas mundiais para a dissuadir de manter uma dieta farta-brutos, que é aquela que inculcou aos netinhos, e também é por isso que papam tudo o que a tiazinha, que é uma espécie de tia-avó, diz.


A tia Mariazinha, para além de já ter sido operada aos joelhos duas vezes e de ter comido mais bolos do que devia, entre lambidelas que foi dando às colheres que usava para os preparar para os filhos, netos e bisnetos, é também a personificação do argumento preferido dos ignorantes. É a personificação da argumentação empirista. É a cartada dos tasqueiros que dizem "Eu sei, porque...", "Eu vi, por isso...", "Eu conheço, porque...", "Conheço não sei quem que disse que...", "Quem vive no sítio é que sabe, porque...". Basicamente, e evitando ser afrontivo, é o argumento que todos nós usávamos nos recreios da terceira classe. Vá, terceiro ano, que o Estado Novo já passou, e tudo pode ser usado para me chamar de fascista. Isto porque este tipo de argumentação falaciosa nunca vem sozinha. Ou seja, nunca é um relato seco nem frio de um episódio ou da experiência pessoal. Vem sempre temperado da estupidez do próprio ignorante que o profere. Por isso, é que quando andávamos na terceira classe (terceiro ano, vá), inventávamos histórias mirabolantes acerca de tudo o que nos dissesse respeito. E, neste caso, é exatamente igual. Com uma agravante. É que na terceira classe (terceiro ano, foda-se), nunca, mas nunca, as nossas mentiras implicavam consequências graves. Depois de adultos, para além de provavelmente nos colocar automaticamente ao nível do frequentador médio dos cursos de Novas Oportunidades e de quem ficou contente por ter recebido um Magalhães para ver pornografia, normalmente tem segundas e terceiras leituras graves do ponto de vista social.


Pior ainda, quando nos convencemos que a nossa tia Mariazinha tem mais razão do que a tia Mariazinha do vizinho, que claramente não sabe fazer um bom pão-de-ló, mas da qual, na verdade, temos inveja, porque faz uns rissóis de peixe do c******.


Vou dar um exemplo. Há por aí agora muito pessoal dito de esquerda que, há uns meses atrás, mandava abaixo tudo quanto a tia Mariazinha dos xenófobos dissesse contra os refugiados, porque a tia Mariazinha dos xenófobos obviamente nunca tinha saído da bidonville, muito menos tinha contacto com estudos sociológicos ou informação relevante acerca do assunto. Simplesmente, tinha a vida inteira ouvido os pais, os avós e os amigos a repetirem a mesma conversa, que todos acabavam por aprender e disseminar. Mais, nessa altura, eram todos uns grandes entendidos em sociologia e geografia política.


Agora, quando a ameaça já não são os refugiados para a tia Mariazinha dos xenófobos, que, na sua cabeça, era uma ameaça perfeitamente real e legítima, mas passou a ser a das extremas direitas dos diversos países que se querem aproveitar do Brexit, porque claramente na UE não há extrema direita nenhuma, a nossa tia Mariazinha é que tem razão. A deles continua a não ter. Mas, desta vez, já nem precisamos de estudos nem notícias. Basta chamar a tia Mariazinha, que ela discorre logo sobre tudo o que é necessário para perceber o Brexit, à la "Brexit para Totós", que é o único tipo de literatura que os fascistas que são a favor do Brexit podem assimilar, ainda que os acusemos de serem uns ignorantes por preferirem dar atenção aos tais estudos sociológicos e termos técnicos que, ainda há meses, esgrimíamos contra a tia Mariazinha dos fascistas.


O problema? É que, tal como no filme do César Monteiro, nenhuma tia Mariazinha ganha nem tem razão, porque o que a tia Mariazinha quer mesmo é montar chiqueiro à janela:

 

 

Ricardo Lopes

 

 

 
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